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Foto do escritorSindicato dos Bancários

Banco Central precisa acordar e estabilizar o real, por meio de juros realistas


Selic baixa está incompatível com estresse internacional, que tem causado fuga de capital e alta do dólar

A crise mundial deu as caras, o que não ocorria desde o resgate de Grécia, Irlanda e Portugal, em 2010/11. Na segunda-feira (9), a Bolsa de Nova York caiu 7%, e o Ibovespa, 12%!

A causa fundamental não é o coronavírus. O gatilho foi o rompimento do acordo de produção de petróleo entre a Arábia Saudita e a Rússia, com a consequente queda de 25% do preço para menos de US$ 35/barril. Vírus são menos temperamentais que seres humanos.

Durante o choque do petróleo, no início da década de 1970, que multiplicou os preços por cinco, o xá Reza Pahlevi, do Irã, ignorou os pedidos do presidente Richard Nixon para que a Opep reduzisse os preços afirmando que "petróleo e política não se misturam". Ao contrário, são inseparáveis.

Na última década, os EUA estiveram à frente de uma revolução ocasionada pela exploração do óleo de xisto betuminoso e pela tecnologia de "fracking", que levou o país ao posto de maior produtor mundial de petróleo.

A produção chegou a mais de 13 milhões de barris por dia, ante 9,5 milhões da Arábia Saudita --o "swing producer" da Opep, uma espécie de fiel da balança do mercado mundial-- e 11 milhões da Rússia, maior exportador fora da Opep.

Em 2020, pela primeira vez desde 1949, quando a EIA (Energy Information Administration) iniciou a coleta dos dados, os EUA passaram de importadores a exportadores líquidos, com saldo positivo acima de 1 milhão de barris/dia de petróleo equivalente.

Rússia e Arábia Saudita, que vêm perdendo significativa participação de mercado para os novos produtores americanos, seguramente se assombraram com a estatística.

Ato contínuo, o governo russo, que sofre sanções do governo americano desde a anexação da Crimeia, em 2014, na sexta-feira passada (6) deu um basta: informou aos sauditas que não reduzirá a produção para sustentar os preços.

A partir do fim deste mês, sauditas e russos iniciarão uma guerra de preços baixos e de aumento de produção, que punirá em particular os produtores americanos, que têm custo de produção mais alto.

Desconfio de que o presidente Trump já tenha contatado os outros dois "machos-alfa" para negociar.

Com o barril abaixo de US$ 50, a Petrobras não consegue remunerar seus investimentos no pré-sal e uma empresa petroleira típica tem prejuízo –nesta terça (10) o barril (Brent) fechou a US$ 37,80.

O que isso significa para o brasileiro médio? O chavão diz que, quando os EUA espirram, o Brasil pega pneumonia. Os EUA estão há 12 anos na expansão mais longa de sua história, propulsionada por montanhas de dívidas, juros artificialmente baixos e bolha de ativos.

Estão viciados em heroína financeira: dependentes de crédito farto e altas contínuas da Bolsa, dos imóveis e dos títulos para a continuidade da expansão. Como o dólar é a moeda de reserva para os países centrais, sua heroína se propaga por meio do sistema financeiro internacional.

A guerra de preços de petróleo, em um cenário global impactado pelo coronavírus, é apenas um gatilho a descortinar a real causa da crise: a insustentabilidade dos preços dos ativos. As empresas médias já sentem dificuldade de financiamento, que pode se agravar com uma eventual quebra de produtores de óleo de xisto ou problemas em bancos, em particular na Itália.

Por aqui, a Selic historicamente baixa em 4,25% está incompatível com o cenário de estresse internacional, que tem causado fuga de capital e alta do dólar. A política do Banco Central de intervenção por venda de reservas, provendo saída fácil ao mercado, não é sustentável.

É preciso que o BC estabilize o real, por meio de juros realistas, ou continuará o risco de deterioração. Roberto Campos Neto tem agido como autômato da meta de inflação e ignorado o perigo: precisa acordar.

Helio Beltrão

Engenheiro com especialização em finanças e MBA na universidade Columbia, é presidente do instituto Mises Brasil.

Folha de SP

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