Bônus e digitalização não reduzem atraso de benefícios sem resposta, que chega a 2,3 milhões de pedidos
Menos de seis meses depois de anunciar a criação de uma estratégia para reduzir o estoque de pedidos de benefícios previdenciários esperando uma resposta, o governo Jair Bolsonaro prepara um novo plano na promessa de solucionar a fila do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social).
A demora em uma resposta prejudica, por exemplo, idosos à espera da aposentadorias. Em média, 900 mil novos requerimentos entram por mês no INSS. Em novembro, 2,3 milhões de pedidos de benefícios sociais e previdenciários compunham o estoque.
Já houve duas tentativas frustradas de zerar a fila, que antes ficava diante dos postos do antigo INPS. Agora, é virtual; os pedidos de benefícios não são mais feitos nas agências, somente pelo site meu.inss.gov.br ou pela Central 135.
A primeira tentativa foi em 2018, durante o governo de Michel Temer (MDB).
A mais recente —apresentada em agosto passado pela atual gestão do INSS, já no governo do presidente Jair Bolsonaro— também falhou. A meta era acabar com a espera até dezembro.
Os dois planos foram focados em tentar aumentar a produtividade dos servidores do INSS. Em dezembro, o presidente do instituto, Renato Vieira, disse à Folha que a estratégia nacional de atendimento tempestivo, como foi batizada a força-tarefa, aumentou o número e a qualidade das decisões. Meses antes, em maio, teve início o pagamento de um bônus aos servidores.
O avanço na digitalização de documentos e a implantação do processo eletrônico deveriam dar agilidade ao sistema, mas essa eficiência não chegou ao atendimento buscado pelo cidadão, que ainda espera muito.
Agora, o atual governo tem mais um desafio: a demora para que o sistema passe a funcionar com as novas regras de concessões de benefícios como aposentadorias e pensões estabelecidas pela reforma da Previdência, em vigor desde o dia 13 de novembro de 2019.
A responsável pela adaptação é a Dataprev (empresa pública responsável pelo sistema da Previdência Social). Apesar de a reforma ter sido aprovada em outubro, a empresa ainda não atualizou os sistemas —e não há prazo para liberar novas análises.
Os atrasos da Dataprev não param por aí. O relatório anual com dados detalhados sobre a Previdência de 2018 até hoje não foi publicado. Isso estava previsto para novembro do ano passado.
O documento serve de base para análises e políticas públicas na área previdenciária. O plano do governo é acelerar o processo para que o sistema de concessão de aposentadorias seja logo ajustado.
Do lado do INSS, a ideia é reforçar o quadro de funcionários para analisar os pedidos de benefícios. Está em estudo a contratação de servidores temporários, obter ajuda de militares em reserva ou realocar pessoal de outros órgãos, como a Infraero. No ano passado, 319 funcionários da estatal de gestão de aeroportos foram cedidos ao INSS para tentar reduzir o estoque.
Desde 2015, 11 mil servidores do INSS se aposentaram. Em 2019, foram 6.000 técnicos e analistas do seguro social que deixaram o atendimento. Na força de trabalho, hoje, estão 23 mil servidores ativos.
A nova força-tarefa foi discutida pelo governo na segunda (6). O plano vem na esteira de duas tentativas frustradas de resolver a fila de espera do INSS. Em 2018, foi criada a Central de Análise nas gerências-executivas. Servidores puderam trabalhar de forma remota, mas com dedicação exclusiva à análise de pedidos de benefícios.
No ano passado, o presidente do INSS apresentou outra ampla estratégia que prometia zerar a fila até dezembro.
Foi instituído o programa de dispensa de horário dos servidores, que passariam a ser cobrados pela quantidade de análises no mês em vez da jornada tradicional de trabalho.
Os funcionários que ultrapassassem a meta receberiam uma bonificação. Para quem optasse pelo teletrabalho (trabalho remoto), as exigências eram maiores.
O plano também previa maior rigidez para gratificação por desempenho e um reforço no número de servidores.
Em nota técnica encaminhada ao deputado Domingos Neto (PSD-CE), relator do projeto de lei do Orçamento da União para 2020, a Secretaria de Previdência diz que a “efetividade do pagamento da bonificação, associada ao aumento da produtividade dos servidores e do aumento da automatização da concessão” levará à redução no estoque.
A previsão do governo é que, de 2,4 milhões em agosto de 2019, o número de benefícios aguardando resposta caia a 285 mil em agosto deste ano.
O presidente do INSS disse à Folha, em dezembro, que a produtividade tinha aumentado 84% entre os servidores que optaram por trabalhar em casa e que as decisões automáticas —aquelas em que o próprio sistema reconhece ou nega o direito ao benefício— passaram de uma média mensal de 9.000 para 73,7 mil.
Procurado, o INSS não deu explicações sobre o fracasso da força-tarefa do ano passado. “O INSS tem demanda variável de requerimentos e, por isso, torna difícil fazer qualquer afirmação sobre extinção do estoque de benefícios”, informou, em nota.
A expectativa do governo é que a melhora na velocidade das concessões resulte em mais gastos previdenciários. Para equilibrar as despesas, deverá haver um esforço com a retomada no pente-fino nos benefícios por incapacidade, que será feito paralelamente à nova força-tarefa.
Somente neste ano, cortes de benefícios que dependem de avaliação médica para serem mantidos podem resultar em uma economia de R$ 5 bilhões. Na primeira etapa, prevista para este mês, 300 mil segurados que recebem auxílio-doença deverão ser chamados.
O BPC (benefício de prestação continuada) pago a pessoas com deficiência também será incluído no pente-fino. Inicialmente, aposentadorias por invalidez ficarão de fora do novo programa de reavaliações.
O pente-fino também é uma medida importada pelo governo Bolsonaro da gestão Temer.
Fonte: Folha