Por: José Dari Krein, para o portal do Sindicato ds Bancários de Campinas
O 1º de maio é para relembrar que o(a) trabalhador(a) precisa ter dignidade e reconhecimento, que não é “um instrumento” à disposição da empresa, mas uma pessoa humana que tem sonhos e quer ter perspectiva de uma vida melhor. É um dia para expressar, de forma cristalina, que está na hora de reverter a piora de perspectiva do futuro para a grande maioria dos que precisam trabalhar, especialmente os jovens e começar a distribuir melhor a riqueza gerada nos últimos anos.
Apesar de grandes possibilidades tecnológicas, o futuro do trabalho, dentro do atual contexto, é de preocupação para ampla maioria das pessoas. As mudanças recentes estão provando uma situação mais desfavorável aos (as) trabalhadores(as).
Caso não ocorram mudanças significativas: (1) não haverá perspectivas de emprego (muito menos emprego de qualidade) para todos os disponíveis, os avanços tecnológicos e as formas de organizar as atividades de produção de bens e serviços tendem a economizar a força de trabalho. Temos no Brasil hoje 32 milhões de pessoas subutilizadas; 2) poucos conseguem boas ocupações e uma grande maioria irá precisar desenvolver ou inventar alguma atividade para conseguir um trabalho com renda, gerando uma crescente polarização social entre bons empregos e ocupações precárias. Por exemplo, somente 15% dos jovens universitários estão conseguindo um emprego no que se formaram; 3) aumento das pessoas que não conseguem preencher os critérios para ter acesso aos benefícios sociais, tais como se aposentar. É uma situação de crescente insegurança social; 4) a ausência de perspectiva reafirma as discriminações contra mulheres, negros, pessoas com deficiência e jovens.
Um problema adicional é que as (não) “soluções” governamentais, diferentemente de outros momentos históricos, vão no sentido de retirar direitos trabalhistas e sociais e de responsabilizar cada pessoa pela situação em que se encontra no mercado de trabalho. Como pode ser visto, por exemplo, nas chamadas reformas trabalhistas e previdenciárias.
Mundo bancário
As transformações que estão ocorrendo na categoria bancária é um bom exemplo. As operações financeiras estão aumentando fortemente, com o avanço de uma economia sob o domínio das finanças. O trabalho bancário também está em profunda mudança com os avanços tecnológicos e as novas formas de intermediação financeira. Os contratados como bancários estão diminuindo, quase 150 mil postos a menos hoje do que em 2012. Lembrando que quase metade da categoria é de banco público, que é importante na composição total, mas está sob forte ataque e pode ser reduzida se as privatizações avançarem como promete o atual governo. Enquanto isto, cresceram muito os contratados como não bancários (securitários, trabalhadores de cooperativas de crédito, agentes autônomos, correspondentes, terceirizados e trabalhadores em fintechs), com condições de trabalho inferiores quanto à remuneração, jornada, forma de contratação e representação sindical. No entanto, esses trabalhadores estão majoritariamente inseridos nas cadeias de valor dos próprios bancos do País, seja pelo controle, pela participação acionária direta ou por parcerias. Por exemplo, o salário médio de um trabalhador de cooperativa de crédito é praticamente a metade do recebido por um bancário, e a jornada é de 40h semanais. Um agente autônomo está na total insegurança, pois não tem direitos assegurados. Talvez seja o desenho para a maioria no futuro, se permanecer a atual tendência.
A pandemia tende a acelerar os processos de mudanças, inclusive de racionalização do uso do trabalho e, ao mesmo tempo, vai aprofundar as mudanças na forma de organização da atividade bancária. Por exemplo, o teletrabalho é uma realidade que irá se consolidar para uma parte dos bancários.
Saídas coletivas
Tem saída, sim. A pandemia está mostrando que precisamos de uma sociedade mais coordenada para enfrentar os problemas estruturais e que o Estado precisa recuperar seu protagonismo na construção de saídas coletivas e não de responsabilização de cada indivíduo.
Por exemplo, se o governo nos últimos anos tem desempenhado a função de socorrer recorrentemente o sistema financeiro, porque ele não pode assumir a responsabilidade de garantir trabalho, socialmente útil, para todos as pessoas na sociedade? Temos muitas necessidades a serem supridas para termos uma sociedade melhor, o que pode ser um fator de criação de ocupações. E o dinheiro? Estamos na sociedade da abundância, uma capacidade de geração de riqueza até agora desconhecida na história da humanidade, mas ela está sendo concentrada nas mãos de poucos. O Estado tem condições de gerar gastos e financiá-los para conseguir ativar a economia, pois, com o crescimento, os recursos investidos voltam, como está propondo no momento o presidente Joe Biden nos Estados Unidos.
Por que não criar um amplo programa para dar ocupação aos jovens que estão se formando nas nossas universidades? É um investimento que dará retorno econômico e social em futuro muito próximo. Para isto é fundamental mudar o pensamento hegemônico atual, começar a tributar os mais ricos, ter um novo projeto de desenvolvimento social e ecologicamente sustentável.
Assim como é fundamental recolocar a necessidade de repartir os trabalhos úteis, por meio de uma redução da jornada de trabalho, de combater todas as formas de discriminação e de valorizar quem trabalha, especialmente os que estão em atividades consideradas essenciais. Isso somente é possível com o reconhecimento de que precisamos ter ação coletiva, o que requer respeitar e fortalecer os nossos sindicatos. Democracia e justiça social somente são viáveis com a existência de organizações fortes de representação dos trabalhadores.
Vamos honrar os nossos antepassados que deram a vida na luta por direitos, melhores condições de trabalho e uma sociedade mais justa. Neste 1º de maio, vamos recuperar a história de que a forma de organizar a produção de bens e o trabalho depende das ações humanas e é possível, pelos avanços tecnológicos e de acumulação de riqueza, ter trabalhos dignos para todos, em que cada um trabalhe para viver e não somente viva para trabalhar, ou seja, trabalhe menos horas e possa viver todas as dimensões da existência.
José Dari Krein, professor, pesquisador e diretor do Cesit (Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho), do Instituto de Economia da Unicamp
FEEB SP/MS
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