Para chegar lá, é preciso contribuir até 40 anos
A possibilidade de ganhar uma aposentadoria no valor máximo pago pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), o chamado teto, ficará ainda mais difícil com a aprovação da reforma da Previdência. Novos trabalhadores e os que não entram na regra de transição dificilmente vão receber o valor máximo, que hoje é de R$ 5.839,45, mesmo os que ganham salários maiores. Isso acontece porque a reforma altera o cálculo da média salarial dos trabalhadores, que serve de base para o valor da aposentadoria.
Segundo a advogada especialista em direito previdenciário Jéssica Matias, atualmente já não é fácil alcançar o teto, e deve ficar ainda mais difícil. “Mesmo quem contribuiu sempre pelo teto, pelas regras atuais, já encontra dificuldade em alcançar esse valor. Isso porque ,nos anos de 1998 e 2004, a atualização do teto foi maior do que a atualização do que foi pago para o segurado, então, houve defasagem no cálculo, a não ser nos casos em que a pessoa trabalhou mais do que o tempo mínimo ”, explica.
Dois fatores da reforma alteram o benefício para o trabalhador: a mudança do cálculo de média e a nova regra de cálculo. Atualmente, para definir o valor que será pago como aposentadoria, o INSS considera apenas as 80% maiores contribuições feitas e descarta as 20% menores, geralmente do início da carreira. Assim, a média fica mais alta do que se levasse todos os pagamentos em consideração.
Com a reforma, a média vai ser calculada considerando 100% das contribuições. As 20% menores não serão mais descartadas, o que vai puxar para baixo a média, que é a base de cálculo da aposentadoria. Parlamentares contrários à mudança criticam a medida, mas o governo insiste que os maiores prejudicados não serão os mais pobres. Segundo o secretário de Previdência do Ministério da Fazenda, Leonardo Rolim, descartar as contribuições mais baixas beneficia contribuintes de renda mais alta, que podem fazer planejamento previdenciário.
Além de empresários e profissionais liberais, ele cita servidores públicos, “principalmente das carreiras de elite”. Segundo Rolim, antes de ingressar no serviço público, esse grupo tem, em média, sete anos de contribuição ao INSS, com salários bem mais baixos, que depois são ignorados no cálculo. “Acabam levando uma aposentadoria de valor médio muito maior do que contribuiu ao longo da vida. Assim, a gente transfere renda exatamente para os mais ricos”, afirmou, em audiência pública no Senado, na última quinta-feira.
Sem bônus
O segundo ponto que reduz o benefício é que o fator previdenciário deixa de existir na nova base de cálculo. Esse índice que considera a idade, o tempo de contribuição e a expectativa de vida do segurado, em parte dos casos, reduz o valor dos benefícios, quando é menor do que um, mas também pode aumentar a aposentadoria de quem tem mais anos de vida e de trabalho, possibilitando o alcance do teto.
A partir da reforma, ele só será válido para quem se enquadrar na regra de transição. Para novos contribuintes, o cálculo consistirá em 60% da média de cálculo, mais 2% a cada ano que exceder o tempo mínimo de contribuição para a aposentadoria. Apesar de mais difícil, alcançar o valor máximo ainda não é impossível, caso o trabalhador contribua por mais tempo.
“Para a pessoa ganhar o teto, terá que trabalhar mais do que o tempo exigido. Levando em conta o mínimo de 15 anos para mulher e 20 anos para homem, para alcançar 100% da média, as mulheres terão que trabalhar, em média, 35 anos e os homens, 40. Então, por exemplo, uma mulher que pagou pelo teto a vida inteira e contribuiu por 40 anos, vai se aposentar com 110% da média das contribuições. Tendo, assim, chance de se aproximar ou de alcançar o valor do teto na sua aposentadoria”, diz a advogada Jéssica Matias.
Planejamento
A advogada ressalta a importância de um planejamento para que os trabalhadores consigam alcançar um melhor valor do benefício. “Não significa que o segurado tem que correr para se aposentar para não pegar as novas regras. Cada caso é um caso. Com o planejamento previdenciário, fazemos uma análise completa do tempo, dos vínculos do segurado, das remunerações, para ter uma previsão de quando ele provavelmente conseguirá se aposentar”, explica.
Com as discussões da reforma, a coach Quezia Florêncio, de 51 anos, foi em busca de um profissional para tirar dúvidas e se planejar. “Eu tinha muitos questionamentos, então fui em busca de uma orientação. Eu poderia me aposentar daqui a dois anos, pelas regras atuais, mas acabei descobrindo que, no meu caso, vai ser melhor esperar mais um pouco. Então, vi que, se eu contribuir por mais dois anos, tenho a chance de pegar quase o teto. Decidi esperar e me aposentar daqui quatro anos”, conta. Ela diz, ainda, que se arrepende de não ter feito o planejamento antes. “Eu fui atrás do INSS, mas muitas vezes te orientam erroneamente. Estava perdida, então procurei por conta própri. Acho importante as pessoas saberem das possibilidades, antes de pedir logo a aposentadoria”, diz.
Correio Braziliense